Este, pontualmente, nasceu como uma preocupação para preencher o vazio de informações confiáveis e fáceis de entender para a população latino-americana com lúpus. Este cresceu como um esquema de pares e se desenvolveu como um programa que incluía profissionais da saúde e pacientes. Assim tem sido a evolução do Falemos de Lúpus, um dos vários programas de comunicação e educação do paciente que, a partir das redes sociais, cria pontes e descobre janelas que nos permitem fornecer informações fiáveis.
As comunidades e redes que se estabelecem na Internet geram sociabilidade e relacionamento entre os seus membros, pois a rede possibilita ultrapassar os limites físicos, permitindo que pessoas com interesses semelhantes se conectem e se relacionem (1).
A principal motivação, neste caso, é apresentar neste programa outros reumatologistas e outros médicos e profissionais da saúde que estejam envolvidos no atendimento de pessoas com lúpus. “É necessário informar de que se trata e o impacto que teve, por acharmos que é uma ferramenta muito valiosa, é importante que a comunidade médica e científica reconheça que este tipo de ferramentas pode ser útil para a educação dos pacientes e que, eventualmente, pode ser útil como um modelo para educar outros grupos de pacientes, não necessariamente lúpus”, diz a Cristina Drenkard, líder do programa e professora associada de medicina na Emory University.
Hablemos sobre Lúpus (com o seu irmão Falando de Lúpus - em português) é um abrangente programa online cujo objetivo é educar à população latino-americana que vive com esta doença. “O Facebook tem sido o principal canal de oferta de recursos educacionais sobre o lúpus em espanhol e português, mas a informação também é disseminada por outras redes sociais (YouTube, Instagram, Twitter) e por meio dos nossos sites (www.HablemosdeLupus.org e www.FalandodeLupus. org)”, diz ela.
PROCESSO DE APRENDIZAGEM
“Foi um processo de aprendizagem, de como os pacientes latino-americanos, os seus familiares se envolvem com as redes sociais e como aceitaram estes recursos educacionais”.
Além disso, este programa foi analisado e publicado no Journal of Clinical Rheumatology como uma iniciativa que visa “preencher as lacunas educacionais dos latino-americanos que vivem com lúpus” (2).
“Preparar este manuscrito e enviá-lo para publicação foi um processo de estabelecimento de objetivos e definição de uma estrutura para transmitir como o programa se desenvolveu e que impacto teve sobre o público. Utilizamos os dados coletados desde o lançamento do programa, que fez parte de sua avaliação, e os submetemos a uma revista que tem um grande público reumatologista”, diz a Dra. Cristina.
Os resultados indicaram que a difusão mais massiva foi através do Facebook, com mais de 20 milhões de pessoas atingidas e 80.000 seguidores em 3 meses, entre as páginas em espanhol e português. “Quase 90% dos seguidores eram da América Latina. Alto engajamento e respostas positivas a uma pesquisa de satisfação indicam que os usuários do Facebook valorizam estes recursos. Os sites em espanhol e português acumularam mais de 62.000 page views e 71,7% dos visualizadores eram da América Latina”, diz a publicação (ver quadro).
O envolvimento do paciente e das partes interessadas é fundamental para fornecer e disseminar uma educação confiável sobre o lúpus. “A mídia social pode ser usada para educar e facilitar as interações entre as pessoas afetadas pelo lúpus e os profissionais de saúde qualificados."
Ele acrescenta que “a educação na saúde baseada nas redes sociais é extensa e escalável em escopo, mas exige mais da equipe profissional do que o site. No entanto, é menos provável que os latino-americanos usem o site como fonte de educação primária porque valorizam as interações sociais ao buscar informações sobre o lúpus”.
FALEMOS DE LÚPUS EN CIFRAS
Crescimento
Falemos de Lúpus
Subscritores YouTube
10.600
Visualizações YouTube
2.067.527
Likes no Facebook
83.900
Seguidores no Facebook
93.537
Seguidores no Instagram
7.059
Fonte tabela: Tomado da referência 2
Estes dados correspondem às redes sociais em espanhol
COMO ALCANÇÁ-LO
Mas para continuar a falar deste programa, é necessário saber como nasceu e a sua evolução, que, tendo em conta a dinâmica das redes e o consumo do seu público, deve ser adaptada aos desafios atuais.
Na entrevista publicada no site da Organização Mundial da Saúde (OMS), O Rajiv N. Rimal, professor associado do Departamento de Saúde, Comportamento e Sociedade da Escola de Saúde Pública Bloomberg da Universidade Johns Hopkins, indica que “a melhor maneira de caracterizar o papel da mídia social é que ela tem um enorme potencial de maneiras que aproximam às pessoas, de maneiras que fornecem assistência em tempo real em momentos de necessidade e para reduzir as diferenças geográficas e temporais entre as pessoas. Neste sentido, tem um potencial tremendo e já estamos vendo evidências de maneiras positivas como as redes sociais podem ser usadas para melhorar a saúde e o status da humanidade. Mas isso vem com custos e perigos potenciais.” (3)
A questão então é como transformar as redes sociais em um canal direto de informação para pacientes e familiares? Viralizar, visualizações, visitas, impacto, tornaram-se palavras-chave neste processo que, embora inicialmente não pertencessem ao jargão científico e médico, passaram das redes sociais para o programa de educação.
“A doença é tão complexa, é um processo todo para poder receber a informação, digeri-la e incorporá-la. Não é algo que com apenas uma conversa o paciente fique totalmente informado ou familiarizado com os diferentes aspectos que a doença pode ter”, diz a médica, levando em consideração que havia uma lacuna de informação para chegar às pessoas.
Foi então que contatou ao Dr. Bernardo Pons-Estel e outros colegas do Grupo Latino-Americano para o Estudo do Lúpus (GLADEL) para elaborar uma proposta. “Eu estava pensando em um site onde as informações para os pacientes seriam compiladas. Tenho uma filha, a Maria Celeste, que é comunicadora social, fez mestrado em marketing com populações latino-americanas e com experiência nas redes sociais, e quando lhe falei sobre essa ideia ela sugeriu que eu começasse por aí, que é por onde as pessoas agora procuram mais informações”, lembre-se. A sugestão naquela época, 2016, era utilizar o Facebook, o canal com maior penetração na população latino-americana.
FALEMOS DE LÚPUS
Na América Latina, diz ela, os mestiços (uma mistura racial entre europeus e ameríndios) têm maior risco de desenvolver lúpus e são mais propensos a serem mais jovens na época do início da doença. “Além disso, eles têm maior risco de nefrite lúpica, doenças cardiovasculares e uma maior atividade da doença do que brancos com lúpus. Fatores biológicos, comportamentais e sociais podem explicar as disparidades étnicas nos resultados do lúpus.”
Embora o atraso no diagnóstico e as barreiras ao acesso aos cuidados de saúde sejam fatores conhecidos que levam a resultados ruins no lúpus, um número crescente de pesquisas sugere que a educação em saúde também desempenha um papel importante
“A educação do paciente e da comunidade é fundamental para promover o autogerenciamento eficaz em pessoas com doenças crônicas, incluindo lúpus. Embora as visitas ao médico sejam uma oportunidade para educar os pacientes, os médicos muitas vezes se deparam com demandas concorrentes e não têm tempo suficiente para atender às necessidades de informação dos seus pacientes. Com isto, a Internet surgiu como uma ferramenta amplamente utilizada para buscar informações sobre o lúpus e trocar experiências e conhecimentos dos pacientes com outras pessoas”, explica.
Diante disso, a OMS destaca que até recentemente o modelo de comunicação predominante era “uma ‘autoridade’ para "muitos", ou seja, uma instituição de saúde, o ministério da saúde ou um jornalista que se comunicava com o público. As redes sociais mudaram o monólogo para um diálogo, onde qualquer pessoa com acesso às TIC pode ser um criador de conteúdo e comunicador. Os profissionais de saúde devem garantir que as informações sejam corretas e acessíveis
“O programa nasceu da necessidade de preencher a lacuna de informação sobre o lúpus entre os latino-americanos de língua espanhola e portuguesa. O lúpus é uma doença autoimune crônica caracterizada por fenótipos heterogêneos com sintomas que variam de leves a fatais”, diz o Dr. Drenkard.
“Fizemos vídeos animados de três a cinco minutos que abordam diferentes tópicos, que foram selecionados por consenso entre reumatologistas do GLADEL e líderes de pacientes de organizações de pacientes com lúpus para terem diferentes perspectivas. Assim, fomos determinando os tópicos mais importantes a serem desenvolvidos”.
PARTICIPAÇÃO DE TODOS
Uma estratégia chave deste programa foi a participação de uma rede ampla e comprometida de atores latino-americanos, incluindo pacientes, reumatologistas e outros profissionais de saúde, organizações de pacientes e especialistas em comunicação, desenho gráfico e alfabetização. Todas as partes interessadas participaram do desenvolvimento, divulgação e promoção do conteúdo entre a comunidade lúpica e o público em geral.
“O nosso público cresceu tremendamente no primeiro ano desde o lançamento e continuou a crescer de forma constante em todos os nossos canais online. Os materiais audiovisuais, disponíveis em espanhol e português, são produzidos de forma a que o público se sinta identificado com as personagens e situações criadas para educar sobre diversos temas, utilizando uma linguagem de fácil compreensão e dando oportunidade ao público de fazer comentários. Desta forma, criamos um diálogo entre os membros do público e um grupo de reumatologistas que respondem às dúvidas e inquietações dos usuários”, afirma a médica.
Os reumatologistas membros do GLADEL coletaram informações baseadas em evidências sobre tópicos selecionados por médicos e pacientes com lúpus para criar o conteúdo principal. “Temos uma equipe de jovens reumatologistas, todos integrantes do GLADEL, que respondem de forma geral (sem fazer diagnósticos específicos ou recomendações terapêuticas) aos questionamentos do público”, afirma.
PACIENTES INFORMADOS
Por meio de comentários orgânicos e de uma pesquisa avaliativa, o público do Falemos de Lúpus indicou aos dirigentes deste programa que aprendem, se comunicam melhor com o médico e se sentem melhor preparados para realizar o manejo da doença. “Acreditamos que o Falemos de Lúpus e o Falando de Lúpus contribuem para a capacitação dos pacientes nos nossos países”, afirma a médica.
“Aproveitamos a ampla acessibilidade à Internet e às redes sociais da população latino-americana para oferecer uma educação confiável e culturalmente competente para a enorme população de língua espanhola e portuguesa que vive com lúpus em todo o mundo. Pacientes latino-americanos com lúpus e os seus amigos preferem a combinação de aprendizagem e interações sociais oferecidas por canais de redes sociais a recursos de aprendizagem individuais por meio de um site. Por este motivo, continuamos usando o Facebook e o YouTube principalmente para educar à nossa população sobre o lúpus”, diz ela.
Este programa proporcionou várias oportunidades para a criação de uma comunidade segura e o engajamento nos diálogos de saúde entre pacientes e profissionais de saúde, fornecendo um modelo educacional inovador para outras condições reumáticas. “No entanto, esperamos realizar uma avaliação para determinar se os usuários têm um papel mais ativo nas suas atividades de autogestão, incluindo a tomada de decisão compartilhada com os seus médicos”.
Além disso, é necessária uma avaliação adicional para informar sobre as possíveis diferenças entre as pessoas nas áreas urbanas e rurais. “Aproveitando estas plataformas de alto alcance e baixo custo, agora estamos conduzindo pesquisas quantitativas e qualitativas sobre a compreensão e a crença que os pacientes têm da doença, as necessidades de saúde e os desafios no manejo da doença pelas características sócio-demográficas”, acrescenta.
A OMS pergunta neste momento qual é o resultado final para o crescimento das redes sociais e da comunicação sobre saúde? A sua resposta é: “Seja estratégico e escolha com sabedoria. Identifique o que precisa ser dito e por quê, para quem e quando. Concentre os seus esforços nas ferramentas das redes sociais específicas relevantes para o seu público e use-as de forma consistente. Uma série de contas de redes sociais negligenciadas ou mal atendidas prejudica a credibilidade. É fundamental que os profissionais da saúde usem as redes sociais para conversar, não apenas para ‘transmitir’ informações. A comunidade global das redes sociais espera ser capaz de agregar valor à conversa, ajudar a corrigir boatos ou desinformação, fornecer feedback ou oferecer experiência pessoal” (3).
TEMAS PARA ABORDAR
Falar sobre o lúpus para dar visibilidade à doença na sociedade; defender e apoiar as políticas de saúde nos nossos países para ajudar aos pacientes a controlar adequadamente a doença; educar aos pacientes e aos seus parentes e à comunidade médica em geral.
Não se trata de uma consulta virtual, para fazer diagnósticos ou para fazer o acompanhamento através das redes. É um canal de comunicação que fornece as informações necessárias, responde às inquietações e gera comunidade.
Para selecionar os temas centrais iniciais, eles realizaram um processo de três etapas. Primeiro, dois reumatologistas latino-americanos com vasta experiência no tratamento do lúpus e na educação do paciente criaram uma lista de tópicos. A lista foi então distribuída a seis pacientes e cuidadores servindo como líderes comunitários de lúpus na Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, El Salvador e México, e um educador PhD de uma grande população lúpica hispânica em Chicago.
Os tópicos foram classificados de forma independente de acordo com a relevância, e os pacientes participantes sugeriram tópicos adicionais. Foram selecionados 25 tópicos e classificados em duas categorias: aprender sobre lúpus (informações sobre a doença) e viver com lúpus (enfrentamento, desafios de autogestão e estratégias para superar estes desafios). “Uma vez lançado o programa, fazemos avaliações formativas periódicas para apurar os temas de interesse que surgem de um mesmo público”, afirma.
“A partir daí desenvolvemos diferentes tipos de recursos educacionais: vídeos animados de 3 a 5 minutos para educar sobre os temas centrais ilustrando aspectos específicos da doença por meio de personagens e cenários; Álbuns de fotos para reforçar os principais pontos dos vídeos já publicados ou explicar com mais detalhes um conceito complexo presente nos vídeos; vídeos de dicas de autogestão com foco nos desafios de viver com lúpus e estratégias de autogestão; vídeo chats transmitidos mensalmente e ao vivo com um especialista em lúpus”, diz ela.
Por outro lado, diz ele, a maior conquista foi ter alcançado milhões de pessoas na América Latina e no mundo (quase 20 milhões de pessoas alcançadas pelo Facebook nos primeiros 3 meses de seu lançamento), ávidas por informações sobre lúpus, demonstrando que as pessoas podem ser alcançadas efetivamente através desses canais de comunicação. O grupo, chamado Amigos de Falemos de Lúpus, é administrado por um líder paciente, que supervisiona o feedback dos membros, garantindo que as regras do grupo sejam cumpridas.
DESAFIOS
“O maior desafio tem sido dar continuidade ao programa com baixo orçamento. No entanto, a colaboração abnegada de membros do grupo GLADEL e dos próprios pacientes, bem como o apoio da Liga Pan-Americana de Associações de Reumatologia (PANLAR), da Liga Internacional de Associações de Reumatologia (ILAR) e dos Laboratórios Glaxo (GSK) tem sido a chave para sustentar o programa”, relata. (4)
“Há muito desconhecimento sobre a doença, não só por parte da população no geral, mas também por parte de muitos médicos. É uma doença complexa que pode afetar vários órgãos de diferentes maneiras, simulando outras doenças. A maioria dos pacientes nunca ouviu falar de lúpus antes de serem diagnosticados, e é muito difícil explicar a complexidade da doença e do seu tratamento."
Além disso, como a doença tende a se apresentar com períodos de surtos inflamatórios alternados com períodos de inatividade ou remissão, “pacientes não informados sobre o curso da doença podem abandonar o tratamento ou buscar tratamentos alternativos, com consequências tremendamente negativas”. Os pacientes devem, então, aprender a conviver com uma doença difícil que muitas vezes os incapacita, e também é difícil para a família compreender a situação física e emocional do paciente.
Por outro lado, diz ele, a maior conquista foi ter alcançado milhões de pessoas na América Latina e no mundo (quase 20 milhões de pessoas alcançadas pelo Facebook nos primeiros 3 meses de seu lançamento), ávidas por informações sobre lúpus, demonstrando que as pessoas podem ser alcançadas efetivamente através desses canais de comunicação. Desde o seu lançamento, Falemos de Lúpus tem sido uma referência educacional para pacientes, familiares de pacientes e a população no geral; e é recomendado por reumatologistas que falam espanhol e português para os seus pacientes.
REFÊRENCIAS
- Carlo V. Caballero-Uribe, Muhammad Asim Khan, Chapter 18 - Patient Education and Patient Service Organizations, Editor(s): Philip Mease, Muhammad Asim Khan, Axial Spondyloarthritis, Elsevier, 2019, Pages 281-286 ISBN 9780323568005, https://doi.org/10.1016/B978-0-323-56800-5.00018-7
- Drenkard, Cristina MD, PhD*; Fuentes-Silva, Yurilis MD†; Parente Costa Seguro, Luciana MD‡; Torres dos Reis-Neto, Edgard MD, PhD§; Ibañez, Soledad MD∥; Elera-Fitzcarrald, Claudia MD¶; Reategui-Sokolova, Cristina MD#; Linhares, Fernanda Athayde MD**; Bermúdez, Witjal MD††; Ferreyra-Garrot, Leandro MD‡‡; Acosta, Carlota MD§§; Caballero-Uribe, Carlo V. MD, PhD∥∥; Sato, Emilia Inoue MD, PhD§; Bonfa, Eloisa MD‡; Pons-Estel, Bernardo A. MD¶¶ Let's Talk About Lupus. Overview of an Innovative, High-Reach, Online Program to Fill the Education Gaps of Latin Americans Living With Lupus, JCR: Journal of Clinical Rheumatology: February 17, 2021 - Volume Publish Ahead of Print - Issue - doi: 10.1097/RHU.0000000000001728
- Bulletin of the World Health Organization 2009;87:566-566. doi: 10.2471/BLT.09.066712
- Falemos de Lúpus https://www.gladel.org/contenidos/2020/08/13/Editorial_2924.php